É indiscutível que a pandemia ocasionada pela pandemia da Covid-19 afetou não apenas o modo de vida da população como também fragilizou os mais diversos setores da economia.
Com a adoção de medidas restritivas que visam controlar a disseminação da doença, foi necessário paralisar todas as atividades que não são consideradas essenciais.
Neste contexto, o Decreto nº 10.282/2020 estabeleceu que, assim como mercados, farmácias, padarias e bancos, a atividade da construção civil é serviço essencial, de modo que não seria atingida pelas paralizações em todo o país.
Ocorre que, por disposição constitucional, os estados e municípios também têm competência concorrente para legislar sobre saúde pública. Sendo assim, diante da omissão do Decreto sobre a edição de normas locais mais restritivas, os estados e municípios passaram a legislar sobre o tema e, em diversos locais, foi determinada a paralização das atividades no setor da construção civil.
Por outro lado, ainda que todos os entes federativos concordassem com a essencialidade da construção civil, de todo modo o setor seria afetado. Isso porque, além do preço elevadíssimo, tem se observado a falta dos insumos necessários ao desenvolvimento da atividade. Diante disso, até nos locais onde está autorizada a realização de obras na pandemia, observou-se uma paralização das construções que estavam em andamento ou prestes a iniciar.
Deste modo, surgiram diversos questionamentos a respeito do cumprimento dos contratos na construção civil, especialmente quanto aos prazos. Em condições normais, a legislação já prevê a possibilidade de alguns atrasos neste setor, como é o caso do “Período de Tolerância” na Incorporação Imobiliária. Esse período figura como fator de mitigação de riscos da atividade, uma vez que atenua fatores imprevisíveis externos que costumam afetar a construção civil, como períodos chuvosos, por exemplo. Essa previsão é reconhecida como válida pelo STJ, desde que não ultrapasse 180 dias.
Contudo, além de já ter ultrapassado esses 180 dias permitidos, é evidente que a pandemia não se encaixa nos riscos habituais da construção civil. Trata-se, em verdade, de uma situação de calamidade pública, extremamente rara, imprevisível e extraordinária. Um caso fortuito que, até então, não se encontrava previsto em lei.
Sendo assim, nos contratos da construção civil passou a ser invocado o critério do caso fortuito/força maior, previsto no art. 393 do Código Civil, a fim de delimitar (e por vezes isentar) a responsabilidade civil. Isso porque, em muitos casos, se verifica a quebra do nexo causal entre conduta e dano, hipóteses nas quais se impõe o reconhecimento da ausência de culpa das empresas (construtoras, empreiteiras, incorporadoras, etc).
Nessas hipóteses, é provável que haja retorno ao “status quo ante, desacompanhado do pagamento de perdas e danos, bem como da aplicação de cláusulas penais, haja vista a presença de causas excludentes da responsabilidade civil”.
Ocorre que os efeitos jurídicos da pandemia sobre esses contratos são os mais variados possível e ainda serão observados a longo prazo, cabendo ao Poder Judiciário realizar uma avaliação de ampla ponderação, um exame detalhado da questão, do ponto de vista da sociedade civil mas também das empresas, que certamente têm amargurado enormes prejuízos desde o início do ano de 2020.
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Gabriela Macedo Advocacia, escritório especializado em Direito Imobiliário, Condominial, Empresarial e Extrajudicial. contato@gabrielamacedo.adv.br. Instagram @falecomaadv
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